O mundo se movimenta em formas de sombras e cores, luzes, som, silêncio e vazio. O mundo está habitado, está repleto, em constante transformação. O mundo vai sobrevivendo, respirando com dificuldade, tomado por violentos choques de ira para depois amanhecer em beleza resplandecente. O mundo se divide em cordilheiras e se esconde em profundezas abissais, e na ausência total de luz se recria para com glória e poder voltar à superfície clamando por respeito e homenagem. O mundo se cala no fim da tarde e sopra seus ventos suaves em campos intraduzíveis, tinge de dourado todas as outras cores como se um de seus pincéis fosse o mestre para todos os outros. O mundo baila no vazio da matéria sutil, atraído e repelido ao mesmo tempo por seus irmãos, tão belos e majestosos quanto ele mesmo. O mundo levou anos sem conta para se vestir de azul e se tornar nossa única morada, num trabalho hercúleo, onde sacrificou-se vezes sem conta para poder renascer e se tornar perfeito. Um trabalho incessante que mesmo agora está em curso, em curso constante, pulsando com força inabalável sob os nossos pés e mostrando que embora esquecido e desfigurado ele se mantém firme em seu propósito de nos sustentar.
Ele é apenas um, pequeno grão de areia em meio a um todo que é tudo e ainda se expande. É apenas uma pequena amostra do que pode ser encontrado lá fora. Pequeno, singelo, frágil e ao mesmo tempo colossal, parte de um sistema físico e químico, parte de nós, parte de tudo, tudo para nós que não podemos ir além dele. Ele habita em nossos sonhos e realidades, faz parte da nossa rotina, é alvo de nossas grandes ambições de sermos grandes, maiores que ele e todo o resto. E mesmo assim todo o resto ainda se mantém tão distante que só podemos alcançar em sonhos. O mundo não se ressente de nossa falta de interesse, ele se dispõe e nos oferece moradia segura, porto seguro. Nos satisfaz a fome, a sede, mas embora grandioso, não é capaz de satisfazer nossa ganância. O mundo sobrevive a nós e se mantém firme no propósito de se manter em equilíbrio com seus semelhantes, para não desestabilizar o todo, porque isso seria muito prejudicial para tudo e para todos. O mundo se mantém, por pura bondade, pois foi criado em bondade e inteligência, uma inteligência que não conseguimos dimensionar tal a engenhosidade e enormidade dos mecanismos em movimento que testemunhamos, cálculos complexos dos quais também somos frutos.